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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

CRÔNICA - Olímpico, havaianas furadas e gremismo de verdade.

Se tu és daqueles que não gosta de uma boa cerveja gelada, futebol aguerrido e arquibancada lotada, amigo, este texto não é pra ti.

Bom... Era verão, mais precisamente 28/11/1996, Grêmio e Palmeiras em campo e só quem esteve no Olímpico sabe o que era um Grêmio e Palmeiras visto das arquibancadas.

Pois lá estávamos eu e meu eterno parceiro de arquibancada, Dutra, sentados (naquele tempo se via jogo sentado na arquibancada), calor, jogo difícil, pegado barbaridade. Djalminha infernizando, quase botou nossa goleira pra trás com uma patada de dentro da pequena área, mas a trave tirou. Palmeiras como sempre dificultando a vida do tricolor e não demorou muito pra tomarmos o primeiro, acho que não tinha trinta minutos, e Palmeiras 1 x 0. Foi quando demos aquela esfriada, e quando voltamos a sentar, eis que surge uma figura que nunca me saiu da lembrança.

Professor, como nós passamos a chamá-lo, 50 e poucos anos, camisa social pra dentro de uma bermuda gasta e nos pés um par de havaianas mais fino que tampa de caixa de sapato. Havaianas que na parte onde o pé apoiava o chão tinha um furo enorme que fazia o Professor sentir o calor da arquibancada como ninguém. Mas Gremista é Gremista e pronto. Não demorou cinco minutos pra fazermos amizade, ele nos perguntou da dificuldade do jogo, pois tinha vindo uma parte do caminho a pé e já tinha 30 do primeiro tempo.

Suava de lavar camisa, nervoso uma barbaridade. Nisto, mais uma vez o Palmeiras foi pro ataque e outro foguete de Djalminha tirou tinta da trave. Foi demais para o professor. Olhou- nos com os olhos cheios de água e disparou: ”peguei o dinheiro do rancho escondido da veia pra vir aqui hoje, o Felipão não vai fazer isso comigo”. Cruzou os braços abraçando as pernas e ficou quieto como que tivesse feito a pior besteira da vida. Pensei... Para alguns é preciso muita garra pra ser gremista. Olhei pro meu amigo que maneou a cabeça como quem diz a vida ás vezes é complicada.

Mas logo tomamos nossa pequena providência, dentro do que era possível. O Dutra levantou e disse: “vou pegar três bem geladas, o professor não merece isto”, e subiu empurrando e pedindo licença rumo á copa. Voltou com três copos derramando cerveja, entregou uma para o professor, que disse: ”que é isso meu filho”... “Para esfriar a cabeça” respondi. Ele agradeceu e tomou o primeiro gole, ou melhor, tentou, pois naquele exato instante Zé Afonso estufava as redes do Palmeiras. Festa geral, cerveja pra todo lado, abraços, GOLLLLLLLLLLLL ecoando nas arquibancadas.

Quando acalmou não demorou um segundo pra um estudante de economia e outro de engenharia montar uma complexa equação: “PROFESSOR+CEVA GELADA= GOL DO GRÊMIO”. Falei pro Dutra na hora: “hoje este tio sai torto do Olímpico”. E o Dutra bradou: “toca pra copa buscar mais três”. Não preciso dizer que o tricolor, como era nossa característica maior, virou um bicho em campo, enchiqueirou o Palmeiras da intermediaria para trás, e enfiou mais dois pra mostrar quem manda. Grêmio 3 X 1, vantagem para o segundo jogo das quartas de final em São Paulo. O resto da história... Grêmio BI CAMPEÃO BRASILEIRO.

O Professor conforme prometido tomou “todas e mais duas”, e quando o jogo acabou nos falou novamente com os olhos cheios de água, e a língua enrolada: “ganhamos gurizada o Felipão não ia deixar assim”, nos abraçou e foi embora. Não tinha camisa do Grêmio, não tinha um tostão, mas tinha duas havaianas furadas e um gremismo de servir de exemplo pra muita gente.

Nunca mais vi e provavelmente nunca mais verei o professor. Mas quando vejo muitos bradarem que a elitização do futebol é caminho único tenho certeza que estes nunca passaram o trabalho do professor para ver o Grêmio jogar. Também tenho certeza que estes não são mais gremistas que ele, e também não são os donos do Grêmio. O Grêmio é de todos os sete milhões que o seguem, que o amam e que muitas vezes gastam o que não podem para acompanhá-lo, pois, como diz a canção entoada pela Geral: “este amor descontrolado, nunca vou deixar de lado, sempre junto ao tricolor eu te sigo aonde for”.

Tenho fé de que a Arena tenha preços e lugares para quem vem de jatinho, carro importado, táxi, ônibus ou, e porque não, pra quem vem montado em um par de havaianas furados.

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